quarta-feira, 20 de abril de 2011

Sobre a não aceitação da condição de civilização tropical




Quando em Nova Iorque, neva muito (e lá pode nevar muito mesmo), cancelam as aulas, fecham os comércios e é recomendado a todos que fiquem em casa. Porque? Bom, há vários motivos, entre eles: reduzir o trânsito pois as crianças deixam de ir à escola e seus pais e conduções já não tem que estar rodando por aí. Mas também tem um fator econômico, pois sai muito caro para a cidade os engarrafamentos, acidentes, doentes por pneumonia, etc. Então as prefeituras ou governos de estados dão o tal toque de recolher, e todo o mundo pode dispensar trabalho, escola, compromisso etc, e as ruas ficam livres para que só saiam de casa, realmente aqueles que precisam por motivos de saúde ou desejam fazê-lo para o lazer (há lazer na neve). Fato é que ninguém fica se queixando de governos e até gostam quando isso acontece, é um dia de folga extra. Ah, eles de fato utilizam o serviço meteorológico e prevêem quando vai cair uma grande nevasca, atencipando as medidas preventivas. O detalhe mais importante disso tudo é que todos: governos, população e mídia, entendem que isso é uma contingência ambiental e que não há alternativas possíveis. Aceitam portanto sua condição de clima frio com nevascas e todo o demais.

Aqui no Brasil é diferente. Pra começar o serviço meteorológico só serve para ilustrar mapas que as apresentadoras gostosas manipulam com muita desenvoltura e charme. Logo, nossa sociedade não aceita que o trabalho, as aulas e o comércio sejam parados por chuvas. Deve ser porque chuva é coisa de terceiro mundo, se fosse neve... Nossos governos não têm capacidade de antecipação diante de iminência de fortes chuvas previstas pelo serviço meteorológico, afinal esse só serve para as gostosas dos telejornais. Cidades como o Recife, têm infinitos problemas de urbanização e saneamento e as pessoas geralmente os culpam pelas inundações. Elas tem razão até certo ponto, mas não de todo. O asfaltamento de todas as ruas do Recife, o que seria percebido como urbanização, na verdade pode até agravar a situação de alagamentos, pois tornaria cidade mais impermeável à água que correria por cima do asfalto.

A queixa maior no entanto é sobre a "paralização" da cidade. Epa, da cidade não, do trânsito. E isso é em grande parte culpa da grande quantidade de carros circulando, a maioria deles com um, duas pessoas. Já imaginaram como seria um sistema de transporte coletivo eficiente? sobre trilhos, ou até sobre rodas mas em corredores exclusivos? Quem anda pela Av. Caxangá em dias assim se sente feliz por estar num ônibus. Mas ônibus é coisa de pobre, vixe.

Pois bem, nós aqui no Recife, não queremos entender que vivemos num clima tropical onde chove mais de 2000 mm/ano e que pode acontecer de cair mais de uma centena desses milímetros em dias, horas. Essa é a nossa contingência ambiental, que deveria ser prevista e tomadas as medidas preventidas, a melhor e mais barata delas, cancelar as aulas, dar ponto facultativo nas empresas e comércios e ficar em casa, vendo a chuva cair, feito índio em dia de chuva, dentro da maloca, conversando, comendo e pensando na vida. Sair só se for pra brincar na chuva.